Olhando uma lista das 100 melhores histórias em quadrinhos do ano
passado fiquei procurando os títulos da DC Comics dos Novos 52 pra
ver como anda a avaliação dessa renovação de uma das maiores editoras
americanas, detentora dos direitos sobre os personagens mais icônicos
da cultura pop. Por mais questionável que seja apagar toda a cronologia (e
décadas de histórias) e reiniciar todo um universo de personagens, esse novo
olhar sobre as origens e as relações entre esses heróis renovaram o mercado dos
quadrinhos, consolidando um mercado pro quadrinho digital e puxaram uma
resposta da Marvel, além de promover essa mídia como um todo.
Como era de se espera o grau de inovação é pequeno. A repetição de
fórmulas, a volta a características clássicas dos personagens ou a tática de
marketing de colocar à frente do título um desenhista estrelado (estilo anos
90) foram as principais ferramentas de todo esse movimento, mas apesar disso é
possível encontrar aqui e ali algum conceito forte, alguma história
nova, alguma arte criativa. Essa lista é sobre esses pequenos detalhes que
valem a pena (a numeração do ranking atende a critérios pessoais e obviamente
não leva em consideração o sucesso editorial).
É mais do mesmo. Geoff Jones só repete todas as inovações que ele mesmo
já havia introduzido no universo dos Lanternas só que agora, pós reboot, de
forma mais organizada, explorando o conflito entre Sinestro e Hal Jordan de uma
maneira mais agressiva e direto ao ponto. Ele deixa o título quando completar a
saga do primeiro Lanterna. Vamos ver no que isso vai dar…
10 – Aquaman de Geoff
Jones e Ivan Reis
Um pouco na esteira do que ele tinha feito com o Lanterna Verde antes do
reboot, Geoff Jones criou um mini universo pra esse herói, fazendo piada da
baixa credibilidade dos poderes telepáticos que controlam peixes, mas levando a
sério a nobreza e os conflitos internos do personagem. Os desenhos de Ivan Reis
reforçam a ideia de uma história de super herói clássica. A divisão
das páginas é bastante conservadora mas os traços são muito
expressivos e dinâmicos. O resultado é acima da média, e cria uma base sólida
pra futuras reinvenções.
9 – Stormwatch de Paul Conelle Miguel Sepulveda /
Peter Milligan e Will Conrad
Juntar o Authority ao Caçador de Marte e colocá-los dentro de uma
nave Demonita que à revelia os transporta pela sangria. É tão improvável que
um roteiro costurado assim funcione que no fim é isso mesmo que acontece. A
natureza bizarra das missões do grupo e a mudança rápida de membros dão uma boa
dinâmica a história. Destaque pro Jack Hawksmoor conversando com a
personificação das cidades na edição 3. Apesar de ter passado pela mão de
3 roteiristas diferentes em 1 ano, a série é sólida. Peter Milligan é um
escritor habilidoso mas não excepcional (que já fez um pouco de tudo e por
isso mesmo sabe conduzir uma história). Na edição 19 chega um novo time
criativo – a lenda Jim Starlin nos roteiros promete trazer o Lobo pra quebrar
tudo.
8 – Batman de Scott Snyder e Greg Capullo
A Corte das Corujas seguido de Morte da Família trás de volta uma
aspecto fundamental na mitologia do personagem – o conceito de família/legado.
Desde a morte dos pais ao relacionamento paternal entre o mordomo Alfred e seu
patrão Bruce Wayne, passando pela relação do personagem principal com seus
protegidos Robins (sendo que um deles é seu filho legítimo), se estendendo pela
história dos antepassados de Wayne. Scott Snyder passeia por muitos aspectos
dessas relações complicadas enquanto apresenta novos inimigos que fazem parte
da construção da cidade de Gotham (outro elemento chave na história do
personagem), e na sequência o palhaço do crime sobe ao palco. Os desenhos de
Greg Capullo são grandiosos e potencializam a dramaticidade desse teatro alado.
7 – Action Comics de Grant Morrison e Rag Morales
Como prometido em seu livro “Supergods”, Morrison revisita várias
características do Super Homem de 1932 e as recontextualiza pro século XXI. O
início da carreira do herói leva em consideração perguntas que seriam naturais
a alguém com tamanhos poderes. Destaque pra edição número 10 da
Action Comics onde o Super discute com os outros heróis da Liga os limites
das ações deles na busca por ideais de igualdade e justiça. Os
desenhos de Rag Morales tem um toque de nostalgia e fazem várias referências a
cenas clássicas de Joe Shuster e Jerry Siegel.
6 – Shazam! de Geoff Jones e Gary Frank
De novo Geoff Jones! Ele já fez de tudo um pouco na editora e conhece
bem o material por isso dão pra ele os títulos peso pesados pra ver se o cara
alavanca. Assim como nos dois casos anteriores ele traz todas as referencias
originais do personagem de uma forma mais realista. No caso de Shazam isso muda
tudo porque os elementos de fantasia da série sempre foram muito fortes, o que
afastou o personagem do publico a partir dos anos 80. Billy Baxton é uma
criança calejada pelos orfanatos e pelas famílias adotivas pelas quais passou,
e focar a história nessa premissa é o que faz com que seja divertida a leitura.
Com a magia tomando mais o espaço da DC (com a Liga Dark e o Constantine em
NY), as possibilidades de bons roteiros futuros aumentam. Destaque pra arte de
Gary Frank que aumenta esse realismo buscado pelo autor. Uma das minhas
preferidas dos 52 que mesmo com poucas páginas a partir da edição 7 de Liga da
Justiça (aliás, 5+2=7), traz de volta a aura da Era de Prata.
5 – Mulher Maravilha de Brian Azzarello e Tony Akins /
Cliff Chiang
Finalmente! A parte menos badalada da trindade da DC passa a ter peso
igual (ou maior) aos outros dois. O Panteão grego entra em cena e a partir da
revisão da origem da personagem a complexidade das relações de parentesco levam
a história a uma trilha épica que moderniza personagens que serviram de
inspiração pra construção do próprio universo DC. A
diagramação clássica e os desenhos limpos reforçam
a importância e a seriedade com a qual as aventuras da heroína sempre
deveriam ser tratadas. Brian Azzarello surpreende pela naturalidade como conduz
a história.
4 – Homem Animal de Jeff Lemire e Steve Pugh
O estranhamento que os desenhos de Steve Pugh causam desde a primeira
página já apontam pro roteiro de terror imaginado por Jeff Lemire. Alguma
soluções gráficas beiram o grotesco, e o conceito de Vermelho e
Podridão renovam o personagem levando ele e toda a família numa busca/fuga
imprevisível. Volta ao topo depois do ostracismo pré reboot.
3 – Monstro do Pantano de Scott Snyder e Yanick Paquette /
Marco Rudy
A arte impactante de Yanick Paquette, dividindo os quadros das paginas
de forma orgânica e mais uma vez os roteiros inteligentes de Snyder
que esconde o monstro por 6 edições até finalmente mostrá-lo
no ápice de seus poderes elementais, são de tirar o fôlego. O
conceito de Verde X Podridão que reintroduz modernizado o
par romântico de Alec Holland e Abigail Arcane conduz esse terror
vertiginoso e o cruza com o argumento do Homem Animal. Força total para esse
personagem que já foi reinventado de forma inteligente algumas vezes.
2 – Batwomam de J. H. Williams III e W. Haden Blackman
É como se Batman fosse mulher desde sua concepção como personagem de
quadrinhos. As histórias no submundo de Gotham, a relação entre a heroína e o
departamento de polícia, a parceira no combate ao crime, e identidade secreta.
J. H. Williams sabe escrever uma história, mas impressionante mesmo é o que ele
faz com um lápis. Se a nona arte tem alguns ícones como Moebius e
Mazzuchelli no seu panteão, Williams já conquistou seu espaço entre os grandes.
Os malabarismos técnicos que ele desenvolveu nos seus anos trabalhando com Alan
Moore em Promethea lapidaram seu talento a um ponto fora do comum. Depois de
cada edição você volta as páginas pra olhar as minúcias da
concepção gráfica de cada cena e os detalhes narrativos das
diferentes técnicas de desenho.
1 – Disque H de China Miéville e Mateus Santolouco
Criada em 1966 essa série já teve várias versões. A premissa é
interessante – um disco de telefone (de antes do celular) que permite que uma
pessoa comum se transforme num super herói por um breve período de tempo, ao
discar 4376 (H-E-R-O). Cada vez aparece um herói diferente com poderes e
uniforme único. Discar outros números (formando outras palavras) tem consequências diferentes.
Um título lado B meio nonsense muito bem escrito por Mieville que trás de volta
a sensação de estar lendo algo novo e cheio de possibilidades. Aliás China
Mieville é professor de redação criativa e já ganhou diversos prêmios de literatura.
Ele faz parte do movimento New Weird que é fortemente influenciado pela ficção
de P. H. Lovecraft. Além de Dial H ele dividiu o argumento de uma história
especial em Hellblazer 250. Mais uma vez roteiros de escritores de outras
mídias (literatura de ficção, neste caso), dão uma renovada no gênero dos
quadrinhos que na maior parte do tempo peca pela repetição.
Fonte:
Quadrinheiros
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