O quarto volume que encerra o especial de 70 Anos de Batman,
lançado pela Panini em março de 2010, tem como tema a
morte. Um evento que nunca é derradeiro para um herói, mas torna-se uma jornada
atribulada a ser superada como tantas outras. A seleção apresenta sete
histórias com ênfase em décadas passadas, principalmente as de 60 e 70,
com duas delas. Em um plano geral, as quatro edições apresentaram ao leitor
contemporâneo visões diferenciadas do Morcego, ainda que o terceiro volume com
duas histórias de ElseWorld – traduzidas no país como Túnel do
Tempo e
analisadas separadamente no site em Gotham City 1889 e Batman – Pulp Fiction – seja considerado aquém de uma
coletânea que pretendia ser um resgate dos 70 anos da personagem.
Nas histórias, percebe-se a evolução da linguagem dos
quadrinhos. Inicialmente, os narradores eram os próprios roteiristas, e a
personagem, quando desejava expressar algo, diretamente fazia-o por meio de um
balão de fala – recurso utilizado no teatro, em que quase tudo é diálogo – ou
em balões de pensamento. O aprimoramento desta linguagem levou o
narrador-personagem a uma melhor interação entre narração e o desenho.
A primeira história do encadernado, A
Estranha Morte de Batman!, é
inventiva ao apresentar uma metalinguagem entre personagem e roteirista. Garder Fox realiza uma pequena trama inicial que
termina com a perseguição de um bandido, e, após este ato, o próprio criador
adentra a história, refletindo como seria esta trama se, por acaso, Batman
morresse. O recurso da quebra da quarta parede – o espaço imaginário em que o
leitor observa a trama – quase caiu em desuso nas HQs. Salvo Grant Morrison, que
demonstra apreço pelo jogo entre obra e leitor, o narrador onisciente não parece
mais adequar-se ao conceito realista, algo que muitas tramas desejam na
medida do possível. Mesmo trabalhando com uma possibilidade, a trama não perde
o final feliz, com um Batman de outra Terra retornando a Gotham para
terminar a formação de vigilante de Robin.
A Vingança de Robin! É acompanhada por Superman nesta aventura em que o menino
prodígio tenta se vingar da morte do mentor. A trama parece reconhecer que o
início dos quadrinhos era simplista, e, de maneira equivocada, tenta
parecer mais densa, exagerando em elementos de dedução e científico que, mesmo para
o pupilo do maior detetive do mundo, parece exagerado. Os heróis se tornam
cerebrais em um limite improvável, como em uma cena que Robin rastreia um
vilão, que usa uma luva de feixes de luz, utilizando um rastreador residual que
lhe possibilitou traçar o caminho do inimigo.
A terceira história, O
Cadáver Que Não Queria Morrer é
a melhor do encadernado, ainda que um tanto mórbida se observarmos a base
temática. A trama faz parte da famosa revista The
Brave and The Bold, que apresentava histórias em parceria com
outros heróis. Na aventura, Batman morre em meio a uma investigação, e Elektron
entra em seu corpo para, entre estímulos de energia, movimentar o Morcego
para uma última investigação. O elemento bizarro não tira o suspense da
história e de maneira absurda demonstra que, mesmo morto, o Cavaleiro das
Trevas é capaz de desvendar crimes e de quebra parecer o personagem central de Um Morto Muito Louco.
A mais longa das tramas, Onde
Você Estava Na Noite em Que Batman Foi Morto?, é dividida
em quatro partes e também carrega um falso sentido de profundidade. Com a morte
de Batman, vilões promovem um julgamento informal para descobrir quem foi seu
assassino, afinal todos querem se vangloriar do aniquilamento do Morcego. São
quatro os depoentes apresentados: Mulher-Gato, Charada, Luthor e Coringa. Mas é
inverossímil um julgamento formal com a presença da galeria de vilões,
como júri, respeitando regras como uma audiência verdadeira, como se
os vilões fossem organizados e não imprevisíveis. Além de uma breve
participação de Superman, a trama contém um bobo plot twist que
revela a sabedoria estratégica do Morcego, novamente exagerada.
Com apenas 14 páginas, em contraposição à longa história
anterior, Enterrado
Vivo apresenta um
bom clima, mas sua brevidade impede aprofundamento adequado no
desaparecimento de Batman. A diferença desta trama é perceptível, mas o final é
antecipado e ameno demais, terminando em um final feliz com Superman, Robin e
Comissário Gordon sorrindo. Uma pureza que não cabe mais nas épocas sombrias de
Gotham.
As últimas duas histórias foram lançadas respectivamente em
1997 e 2001. As páginas inteiramente coloridas, sem a borda branca de outras
fases, é um demonstrativo de um estilo narrativo que se mantém até hoje. São
tramas com narradores em primeira pessoa, com os desenhos e a ação trabalhando
em sincronia. A primeira foi publicada no oitavo número de Chronicles e tem Thalia como personagem central
narrando sua missão, dada pelo pai, de matar o Morcego. A filha de Ra’s Al Ghul
se divide entre a obrigação com o familiar e o amor pelo herói, amor este que
gerou até um filho, o garoto Demian, inserido na cronologia oficial por Morrison em Batman e
Filho. A última história, com apenas quatro páginas, foi
publicada em uma edição de Asa
Noturna como
secundária. É tão breve e boba que está presente na revista apenas pela
incapacidade de inserir-se uma aventura maior. Trata-se de um sonho em que
Mulher-Gato imagina o casamento com Batman e sente ciúmes quando, próximo da
lua de mel, o Cavaleiro das Trevas precisa combater o crime. A história termina
quando Selina acorda. Nada demais.
Como exercício de possibilidades, o compilado demonstra que
a morte sempre esteve presente nas histórias em quadrinhos como um dos recursos
narrativos mais utilizados. Porém, longe dos dois primeiros volumes, que ao
menos tentam apresentar um panorama do herói, as histórias das estranhas mortes
de Batman não deveriam se destacar como parte de uma série que deseja ser uma
referência para os 70 anos da personagem.
Por Thiago Augusto Corrêa
Fonte: Vórtex Cultural
Fonte: Vórtex Cultural
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