Faz mais de
75 anos, desde que um alienígena que veio a nosso mundo aprender lições sobre
os valores morais e éticos da humanidade, e também nos ensinar a sonhar e lutar
por um amanhã melhor. Através de décadas, se tornou um mito da nossa cultura,
ganhando diversas formas e conceitos. Por isso que veio agora com um especial
sobre Superman, composto por seis partes, para discorrer um pouco sobre essa
figura tão importante para os quadrinhos e o mundo. Começamos então com sua
gênese no Kansas, onde reside as raízes terrestres que definiram sua bússola
moral, através das minisséries O Homem de Aço e As Quatro Estações.
O Homem de Aço
Logo após a
clássica saga Crise das Infinitas Terras da dupla Marv Wolfman e George Pérez,
a editora DC então decidiu aproveitar o fato de ter revirado o seu multiverso
(com suas múltiplas realidades) e assim aproveitou a oportunidade, resolvendo
mexer na história de seu universo principal e reformulá-lo. Dentre essas
alterações, logo novas origens surgiram de certos personagens, entre elas, a
mais importante dessas reinvenções é unanimemente que foi a que aconteceu com o Superman.
Quem ficou
a cargo de reinventar este super-herói foi ninguém menos que o renomado artista John Byrne (que cuida da arte e roteiros), ao lado de Dick
Giordano (o responsável pelo pincel), numa minissérie em seis partes que
encapsula os principais eventos para a formação do novo universo do Superman
que seria estruturado, que já estava sendo restabelecido por Marv Wolfman e
Jerry Ordway em Adventures of Superman, um dos títulos mensais do personagem. O trabalho nessa
reconstrução do Superman é deveras notável, não só por ter limado elementos
questionáveis e excessos que o personagem sofria, mas por canalizar o idealismo
que ele simbolizara.
Começa em
Krypton, num diálogo entre o casal Jor-El e Lara sobre o fim de seu planeta,
que ilustra o quanto a civilização kryptoniana se considera avançada através de
seu elitismo, seus ideais homogêneos e o metodismo, fatores que os tornaram
frios. Com a iminente explosão de seu mundo, enviam seu filho Kal-El em direção
à Terra, lugar o qual Lara teme por parecer um ambiente selvagem e inóspito
para os padrões kryptonianos.
Na Terra,
Kal-El ganha o nome de Clark e assim começa a viver o sonho americano, sendo
criado pelos bondosos fazendeiros Jonathan e Martha Kent, ele agora é um aluno
exemplar e astro do time de futebol americano do colégio em que estuda. Byrne
dá a ele o físico ideal dum homem no ápice de sua capacidade, alto, forte e com
o sorriso digno de um John Wayne. Clark é um garoto puro, acredita no valor da
moral e do que é correto acima de tudo, que é sua principal bússola quando
assume a capa de Superman ao abandonar Pequenópolis, cidadezinha do Kansas.
Ao
descobrir sua origem e papel a desempenhar no mundo, resolve partir para
Metrópolis, a cidade do amanhã e onde tudo acontece, o centro do mundo como uma
espécie de Nova York do universo DC. Lá conhece a destemida repórter Lois Lane,
que se tornaria seu novo amor, e o poderoso empresário Lex Luthor, seu maior
arqui-inimigo. Também encontra sua vocação como jornalista no Planeta Diário,
onde consegue estar informado a todo momento, e cria um novo gestual de se
impôr ao mundo como disfarce, como um rapaz corcunda, tímido e desajeitado.
Lembrando o que o cineasta Quentin Tarantino concluiu num monólogo escrito por
ele para Bill, personagem da sua duologia entitulada Kill Bill, pois esse
disfarce seria a visão de Kent sobre os humanos. Tornaria fácil para se misturar
entre eles, porque esta é a forma que um deus os enxergaria. Claro que em Homem
de Aço, Byrne deixa claro que Superman é apenas o alter-ego de Clark, e não o
contrário como ocorria antes.
E é
realmente vital que dê importância para Clark, pois suas raízes sulistas são
que lhe define sua atitude como super-herói. Há uma representação
do velho e muito bem conhecido “American way of life” nele, a cidade que
crescera ilustra o coração da nação estadunidense, enquanto a cidade que
decidiu residir e proteger a qualquer custo parece um paraíso terrestre onde
criminosos são invasores ou figuras à parte do modo de vida de seus habitantes.
Talvez haja nacionalismo quando Super derrota um grupo de piratas estrangeiros
que invadem o navio de Luthor, este que é a figura representativa da opressora
força do capitalismo o qual lhe serve para reger Metrópolis. Mas Superman se
opõe a ele, retomando os valores da verdade, justiça e liberdade que o sistema de
“democracia” norte-americano tem orgulho, como o “imigrante” que veio vencer e
prosperar na América dos sonhos. Isto que talvez mostre como um escoteiro do
governo estadunidense, mas é um ideal que faz o personagem ser tão inspirador
como é. Mesmo quando Luthor cria seu clone, Bizarro, sua legítima deturpada
versão, este ainda pratica o bem inconscientemente e inconsequentemente, como
vestígios da personalidade do kryptoniano.
No seu
primeiro encontro com o vigilante Batman, que tanto seu modus operandi e sua
cidade de operações são tão diferentes ao que Clark está habituado, percebe-se
um contraste natural martelado por Byrne em diálogos idealistas e ambientações
noturnas. Enquanto o truculento Batman se mistura com sua cidade envolta a
decadência humana, Superman com sua conduta moral e otimista é um feixe perdido
de luz naquelas trevas. Ali talvez ele entenda seu papel, combinado com a
criação de seus pais adotivos e o desejo de seus pais biológicos, o Superman é
a aurora do homem diante a um novo tempo iluminado por sua bondade, este que
deve cuidar para guiando o povo que lhe acolheu em direção a uma nação melhor.
As Quatro Estações
No fim dos
anos 90, a dupla Jeph Loeb e Tim Sale (de Batman: O Longo Dia das Bruxas,
Homem Aranha: Azul, Batman: Vitória Sombria) resolveu investigar o espectro
humano das aventuras de Superman numa minissérie em quatro partes chamada A Superman For All Seasons, que
aqui foi lançada com o conciso título Superman: As Quatro Estações. Através de depoimentos dos próprios personagens, a história
procura ilustrar o que o super-herói simboliza tanto para a humanidade quanto
para si mesmo, como o jovem Clark Kent (seu alter-ego e possuidor do fardo de carregar a capa) da
humilde cidadezinha de Pequenópolis, no estado do Kansas, parte do coração da
nação estadunidense.
Inicia-se
na Primavera, quando a natureza floresce como nunca, encontramos Clark e seus
amigos, Lana Lang e Pete Ross, lidando com a chegada da vida adulta, fase
repleta de responsabilidades e de realizações. Enquanto Lana sonha apenas em
levar uma vida pacata ao lado de Clark, sua paixão, e o ambicioso Pete traça
mil planos como um futuro milionário, enquanto o garoto dos Kents, família de
fazendeiros, demonstra sua modéstia e apenas procura descobrir seu lugar no
mundo, como um alienígena deslocado em outro planeta e um rapaz com dotes
especiais que pode ajudar o mundo.
Após o
“desabrochar” de Clark com seu surgimento como Superman em Metrópolis, o novo
salvador da humanidade, a determinada repórter Lois Lane nos conta sobre todo o
alvoroço que a aparição de alguém como ele representava num determinado verão.
Numa mistura de admiração e dúvida, ela dá um retrato apaixonado e bastante
significativo como aquele herói azul e vermelho representa a esperança dum novo
e melhor mundo através de seus atos heroicos, inspirando toda uma população.
Claro que
nem todos apoiariam um herói do povo e logo aparece o magnata Lex Luthor, rico
empresário e figura de maior poder e influência na cidade, que vê seu império
ameaçado diante dum ser como o Superman. No outono, quando o que já florescera
se esvai de vida, Luthor leva o homem de aço para enfrentar sua primeira grande
provação para se mostrar digno de carregar os sonhos duma metrópole em seus
ombros. A inveja latente na mente do vilão revela o medo do homem em frente a
algo indomável que incita o levante dos oprimidos.
No calmaria
do inverno, Lana Lang reencontra aquele que tanto esperara, Clark Kent, que
resolve passar um tempo em Pequenópolis para resolver suas crises existenciais.
Jeph Loeb fecha aqui o ciclo, levando Clark para se reencontrar com seu
passado, daquela primavera tão longínqua quando decidira seu destino, em
diversos diálogos acompanhados por recordatórios reflexivos de Lana, sonhos e
fantasias são desconstruídas e a realidade dá origem a novos objetivos e
compreensões.
As Quatro
Estações é um estudo intimista no universo tão particular do Superman, em meio
a diálogos sinceros em seus sentimentos e carregados duma franqueza incomum,
Jeph Loeb demonstra uma boa forma como escritor que é raríssima nos seus
trabalhos hoje em
dia. Enquanto Tim Sale compõe os personagens com traços
pueris, dando uma forma quase totalmente caricata a eles, destacando suas
principais características. E o trabalho do colorista Bjarne Hensen consegue
dar vida aos desenhos de Sale e ao texto acalorado de emoções de Loeb. É uma
obra que ao realizar ligações com eventos de O Homem de Aço de John Byrne, vai
ao âmago de seus personagens para buscar um entendimento maior sobre as
consequências e ensinamentos que um jovem garoto vindo do coração dos EUA provocou
ao mundo.
Fonte: Nerd Geek Feelings
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