Antes de falar da obra de John Byrne, ou
melhor, da versão feita em 1994 por John Byrne para o O.M.A.C. (One Man Army
Corps ou Exército de Um Homem Só), temos que falar de seus antecedentes. OMAC
foi criado por Jack Kirby em 1974, no final de sua fase na DC Comics, na qual
criou os Novos Deuses, Kamandi e Etrigan, o Demônio. O.M.A.C. talvez seja o
projeto mainstream mais autoral de Jack Kirby, já que, no final do seu contrato
com a DC, com essa série ele preenchia sua cota mensal de 15 páginas. O.M.A.C.
tem uma origem estilo Shazam!, mas ele está mais para uma espécie de Capitão
América que luta contra as corporações. Ele é Buddy Blank, ou na tradução
literal, Chapa Branca, que é selecionado pelo Irmão Olho, uma espécie de Big
Brother que a tudo controla e tudo vê, e é transformado em O.M.A.C.. A série de
Kirby durou apenas 8 edições. A minissérie em quatro partes escrita por Byrne
serviu para unir as pontas soltas da história de Kirby.
Então agora vamos falar da série de Byrne.
Ela começa no futuro, onde O.M.A.C. está travando a Grande Guerra das
Corporações, contra as maquinações de seu arqui-inimigo Mr. Big. O interessante
aqui é que Byrne conta a história de uma maneira diferente do que ele fazia em
suas consagradas histórias estilo Marvel. Aqui ele usa captions em off para
conduzir a história. Até aí nada diferente, mas as captions funcionam como
recordatório, mas ao mesmo tempo funcionam como diálogos, já que as duas coisas
se confundem na cabeça de O.M.A.C, e os personagens, não apenas o Irmão Olho,
interagem com elas. É nessa história que ocorre o confronto final entre
O.M.A.C. e Mr. Big, em que nosso herói mata o vilão. Porém o inimigo tinha um
recurso final, aperta um botão e ele e O.M.A.C. desaparecem.
IRMÃO, VOCÊ PODE COMPARTILHAR UM OLHO?
Com essa expressão de epígrafe, começa a segunda história, inspirada na canção Brother, Can You Spare me a Dime (Cara, cê pode me dar um troquinho?) que ficou Brother, Can You Spare me an Eye no inglês. A intenção é fazer uma referência ao Irmão Olho, mas também à época em que a história passa a acontecer: 1932. Buddy Blank é transportado para o passado. Mas lá ele é apenas um garotinho sem poderes – muito similar a Billy Batson, não por acaso os dois nomes têm a aliteração BB e ambos são Exércitos de vários nomes, uma vez colocados os deuses que compõem o anagrama SHAZAM!.
Na Nova York
pós-depressão, Buddy encontra a família de Molly, por quem se apaixona e passa
a viver. Mas Buddy se recusa a se render às corporações que estão começando a
se formar nos Estados Unidos, como a do Sr. Bigello (qualquer semelhança não é
coincidência). Buddy começa a ter pesadelos com o futuro e vai tirar
satisfações com o Sr. Bigello, que foi responsável pela morte do pai de Molly.
Mas não sem antes perceber que a empresa PseudoPessoas Inc., de propriedade de
Bigello, vai de vento em popa. Inclusive tendo criado maneiras do
indivíduo curar suas frustrações. Num sonho, somos remetidos à versão de Buddy
de Jack Kirby, inclusive. Bigello descobre que Buddy é O.M.A.C. (coisa que nem
ele sabia) e passa a tortura-lo. Julgando que Buddy estava morto, Mr. Big – que
também tinha voltado no tempo para garantir seu domínio corporativo – o
abandona. Então Buddy contata o Irmão Olho e se transforma em O.M.A.C.
novamente.
MiNHA LUTA
Ou Mein Kaempf, o famoso livro
biográfico de Adolf Hitler, intitula o terceiro capítulo. Nele, o frágil Buddy
se transforma em O.M.A.C. que, retomando as memórias do futuro, perde as do
passado. Se esquece de sua vida com Molly, que agora era esposa de Buddy, e
retoma sua missão de erradicar Mr. Big. Ele fica sabendo que Mr. Big tem planos
de utilizar Adolf Hitler para atingir seus objetivos corporativos. O que
O.M.A.C. faz? Vai até a Alemanha e incinera Hitler. Em meio à isso, sua esposa,
Molly é torturada por Mr. Big. Quando O.M.A.C. retorna, ele se torna Buddy
outra vez e não pode salvar sua mulher porque perdeu a conexão com o Irmão
Olho. Mas Molly chega por trás de Big e lhe acerta cadeiradas e mais
cadeiradas, pondo fim à vida do empresário beligerante.
Na última
parte, que se passa no ano de 1991, ou seja, mais ou menos sessenta anos depois
do ocorrido, Buddy está no enterro de Molly, reclamando sobre os eletrônicos e
a inteligência artificial com seus filhos e netos. Junto com um amigo, Buddy
acabara criando uma indústria de Pseudo-People. Então, Buddy se torna O.M.A.C.
novamente, quando resolve acessar o Irmão Olho novamente. Então Buddy/O.M.A.C.
confessa ao irmão olho que cometeram um erro ao matar Hitler e impedir a
Segunda Guerra Mundial. Segundo ele, as guerras e as intempéries deixam a
humanidade mais forte, como grandes testes para forjar nossas forças. Volta-se
então para o paradoxo das viagens do tempo que iniciam um ciclo que não pode
ser interrompido. Para o ciclo ser quebrado, O.M.A.C. precisava tomar uma
atitude. O que ele faz é pressionar um botão, o mesmo que o transformava no
Exército de Um Homem Só e encerrar sua vida.
Os padrões
cerebrais de O.M.A.C. então, são transferidos para o Irmão Olho, que passa a
ter uma perspectiva humana do mundo, não mais a de uma inteligência artificial.
Dessa forma, voltamos ao futuro, e voltamos à gênese de O.M.A.C.. Assim
voltamos às histórias criadas por Jack Kirby. Quando Buddy reencontra o Irmão
Olho, ele lhe dá um dispositivo para evitar encontrar Mr. Big no futuro. E
assim, volta ao passado, tentando romper o ciclo de antagonismo entre herói e
vilão. Se foi bem-sucedido? Nunca saberemos, pois assim se encerra a história
de John Byrne.
PROCURANDO SOLUÇÕES DIFÍCEIS
Viagens no
tempo, como confessa no epílogo da última edição, são o tema preferido de John
Byrne. Ele também diz que o mote “tudo que o personagem sabia está errado”, é
algo corriqueiro na indústria de quadrinhos americana e chamar a atenção para
uma nova origem é uma das formas mais fáceis e mais preguiçosas de criar uma
história – aqui ele faz uma crítica aos reconstrutores ingleses como Moore e
Morrison.
A solução de
Byrne foi criar linhas de tempo divergentes – o que, convenhamos, também não é
nenhuma inovação, tendo visto seu trabalho com Claremont em X-Men: Dias de Um
Futuro Esquecido. O mundo que Jack Kirby previu em seu O.M.A.C. é muito
diferente do que temos hoje, então para explicar isso, Byrne utilizou esse
recurso. “Longe de descobrir o quanto ele estava errado, OMAC é guiado pela
determinação marcial. Quem, a não ser um soldado devotado, chegaria à conclusão
de que a Segunda Guerra Mundial foi uma coisa necessária?”, aponta Byrne.
Sem o
intuito de entrar em conclusões filosóficas sobre se a Guerra é necessária, só
faço um adendo: sem a Segunda Guerra Mundial, os super-heróis teriam
fracassado. Você não estaria lendo este texto e nem mesmo indo aos cinemas ver
os filmes da Marvel. É preciso frisar que foi durante a Segunda Grande Guerra
que os comics tiveram seu apogeu, vendendo o recorde de 2 milhões de unidades
ao mês. E sem falar em vendas, falando em conteúdo, quantas histórias dos
mesmos não tem sua gênese extraída dos horrores da guerra, do ufanismo, da rosa
de Hiroshima, a Enola Gay, a Bomba H, que transforma todos os horrores
nucleares em maravilhas de capa e poderes sensacionais. O que seria da
indústria de quadrinhos de Super-Heróis se não houvesse um Adolf Hitler? Fica a
pergunta.
Por Guilherme Smee
Fonte: Splash Pages
2 Comentários
tem que fazer uma revista com a história "O que aconteceria se Hitler não tivesse existido"? sem Filosofada de Guerrilha eu achei esse Omac muito parecido com o Gladiador da Guarda Imperial Shiar!! Marcos Punch.
ResponderExcluirE não é que é mesmo. O OMAC tem um visual parecido com o Gladiador Shiar, principalmente o que o Byrne desenhou!
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