Como disse a lendária Rita Lee: “Sexo frágil, não foge à luta. E nem só de
cama vive a mulher”. Em harmonia com as palavras dessa música, nosso
colaborador Giulianno de Lima Liberalli mostra toda a força das heroínas Marvel
e DC. “Tá na hora do pau!”.
Um quadro que vem mudando há décadas
no mundo das HQs é o do papel das mulheres no mundo quase sempre masculinizado
dos super-heróis, cada vez mais as super-heroínas vêm ganhando destaque e importância
nas tramas dos heróis das maiores editoras mundiais, aumentando até a
quantidade de títulos dedicados a elas. É um reflexo da tendência mundial de
que as mulheres estão cada vez mais ocupando posições elevadas, de
responsabilidade e ganhando reconhecimento em diversas áreas. De frágeis
mocinhas em perigo a heroínas que acabam salvando a pátria nos momentos de
tensão, definitivamente as mulheres passaram a lutar ao lado dos grandes heróis
em termos de igualdade indo contra o velho estereótipo de que elas não passam
de objeto de desejo ou de coadjuvantes necessárias para enriquecer a cena e dar
algum motivo para heroísmos. Um bom exemplo de que as mulheres nas HQs vêm
assumindo posição cada vez maior é Amanda Waller, a responsável pelo Esquadrão
Suicida, com personalidade e gênio determinado ela coordena sem dó nem piedade
uma equipe composta por alguns dos vilões e assassinos mais perigosos da DC em
um cargo que muitos homens pensariam bastante antes de assumir e a SHIELD, que
por muito tempo foi controlada pelo emblemático Nick Fury, tem uma mulher no
comando, a diretora Maria Hill. Até Tony Stark confiou o comando de suas
empresas para Pepper Potts, quem se lembra das antigas histórias do Homem de
Ferro sabe que no começo ela era a simples secretária das Indústrias Stark,
tímida e indefesa.
Nas clássicas aventuras de Flash
Gordon e do Fantasma, as mulheres eram as companheiras que participavam de
algumas missões e que quase sempre precisavam ser salvas de uma armadilha ou de
algum perigo para que as habilidades dos aventureiros fossem colocadas em
prática, Nesse rolo entra também Lois Lane, a eterna amada do Superman que foi
a ‘mocinha em perigo’ por muitos anos até começar a desempenhar um papel mais
ativo nas missões do homem de aço saindo de trás da famosa capa vermelha. Nesse
ponto que os quadrinhos estão acompanhando as mudanças comportamentais em
relação às mulheres, cada vez elas tem se mostrado um público presente e
exigente no mundo nerd, terra exclusivamente masculina até bem pouco tempo atrás.
Só que não é uma tendência tão recente
as mulheres se tornarem as protagonistas das aventuras normalmente destinadas
somente aos homens, antes da Mulher-Maravilha surgir com o seu laço da verdade
tivemos Sheena, rainha das selvas e versão feminina do Tarzan criada por Will
Eisner e Jerry Inger em 1938, heroína cuja personalidade era totalmente diversa
das frágeis donzelas combatendo ela mesma seus desafios, na raça. Nessa esteira
tivemos Lady Luck, Phantom Lady e Miss Fury. Essas foram as primeiras aventureiras
das HQs, justiceiras sem poderes especiais que combatiam o crime com
habilidades normais, até janeiro de 1940 Gardner Fox criar Shiera Sanders, a
companheira do Gavião Negro e em julho de 1941 ela recebeu suas asas, uniforme
e codinome se tornando Mulher Gavião e, consequentemente, a primeira
super-heroína com poderes especiais das HQs.
A Mulher-Maravilha apareceu pela
primeira vez em dezembro de 1941 na revista All Star Comics, criada por Charles
Moulton como a versão feminina do Superman. A intenção do seu criador era a de
mostrar ao mundo que aquele era o tipo de poder que deveria dominar o mundo: o
amor, personificado na forma bela, perfeita e poderosa da guerreira amazona, na
verdade Moulton pregava que o mundo deveria estar no controle das mulheres,
pois elas são mais propensas a resolver tudo usando amor e compreensão,
entretanto na maioria das vezes as mulheres sempre foram retratadas pelo seu
aspecto de pura beleza sem mais nenhuma utilidade, meros corpos bonitos cuja
função era de apimentar a imaginação dos heróis e dos leitores e elas acabaram
mostrando que eram peças mais importantes do que se imaginava, com uma atuação
mais profunda e relevante. Baseado nisso vou listar aqui algumas das personagens femininas mais famosas dos mundos Marvel e DC e
como mudaram de sua criação até os tempos atuais, refletindo o que estou
expondo nesse texto: como elas acompanharam a evolução do, cada vez maior,
poder feminino no universo dos super-heróis.
Mulher-Maravilha:
Criada por Charles Moulton, pseudônimo
usado pelo psicólogo Willian Moulton Marston, para ser a heroína embaixatriz da
paz, aquela que iria inspirar as mulheres a lutarem contra o machismo e a visão
de que o papel feminino sempre foi o da subserviência como sendo o sexo frágil
destinado a ter somente tarefas domésticas e sem relevância histórica. Sua
importância e destaque foram tantos que hoje ela representa a Trindade
principal da DC Comics ao lado do Batman e do Superman, foi protagonista de uma
série nos anos 70 lembrada até hoje e estará em Batman VS Superman, retratada
de forma mais fiel pela primeira vez em uma grande produção, fora que grandes
nomes já trabalharam em suas histórias como George Pérez, Alex Ross, Stan Lee
na série Imagine e John Byrne. Curiosamente, Charles Moulton foi o criador do
polígrafo, o detector de mentiras e dotou sua personagem dessa capacidade
através do seu laço mágico, o qual ninguém pode resistir e falar a verdade. E,
reflexo do machismo da época, sua função sugerida para entrar na Sociedade da
Justiça dos anos 40 era a de ser secretária do grupo. Até seu uniforme não
podia exibir demais seu corpo.
Mulher
invisível:
Ela não é só esposa de Reed Richards e
integrante do Quarteto Fantástico, Susan Storm Richards também é uma das mais
fortes heroínas da Marvel e salvou o grupo em várias situações. Criada por Stan
Lee e Jack Kirby para ser a mocinha das histórias do Quarteto, seus poderes
nunca tiveram grande relevância para o grupo, por muito tempo foi conhecida
como Garota Invisível, meio que um subterfúgio em que ela sempre estava em
segundo plano ou exercendo posição de apoio nas missões. Isso até John Byrne
assumir o grupo e mudar radicalmente a natureza de cada um dos integrantes e
uma das mais afetadas por essas mudanças foi Susan: passou a ser chamada de Mulher
Invisível, retratando seu amadurecimento como heroína, seus poderes ganharam
muitas nuances nunca antes exploradas pelos seus criadores, como deixar pessoas
e objetos invisíveis, dar forma e densidade ao seu campo de força tornando-os
mais fortes e perigosos, ela pode projetar um pequeno campo dentro de um corpo
sólido, expandindo-o até destruir o material, imagine o efeito em um corpo
humano.
Canário
Negro:
Criada em 1947 por Robert Kanigher e
Carmine Infantino para a revista Flash Comics #86, Dinah Drake era uma
aventureira especializada em artes marciais, perita em investigação, seu visual
de roupas e jaqueta de couro aliada à famosa meia arrastão fizeram dela uma das
personagens mais conhecidas da DC. Com a Crise, sua história foi dividida em uma
saga de gerações aonde a primeira Canário Negro era Dinah Drake, uma das
fundadoras da Sociedade da Justiça na Época de Ouro e sua filha, Dinah Lance,
herdou seu manto na Era de Prata se tornando a atual Canário Negro influenciada
pelo passado da mãe e dos seus amigos heróis, assim como a mãe ela é uma
excelente lutadora e investigadora, porém tem um super poder: o Canto da
Canário, suas cordas vocais conseguem gerar um grito supersônico que pode ser
devastador. Ela é outra personagem que ganhou mudanças e importância com o
passar do tempo, chegando a integrar uma equipe de vigilantes composta somente
por heroínas: as Aves de Rapina.
Supergirl e
Batgirl:
Em agosto de 1958 Superman descobriu a
existência de outra sobrevivente de Krypton: sua prima Kara-El, a cidade de
Argo sobreviveu a destruição do planeta e foi lançada ao espaço, porém
fragmentos de kryptonita ficaram alojados no seu solo ameaçando a vida dos
habitantes e seu pai não viu outra alternativa a não ser mandá-la para a Terra
e viver ao lado do primo super-herói. A identidade de Batgirl originariamente
pertenceu a Betty Kane, sobrinha de Kathy Kane, a Batwoman, criada por Bob Kane
em 1961 ela passou a se chamar Labareda e integrou os Titãs da Costa Oeste, na
verdade Barbara Gordon se tornou Batgirl na clássica série de TV do Batman nos
anos 60 e depois isso foi passado para as HQs, após a Crise ficou estabelecido
que Bárbara Gordon sempre foi a Batgirl até ser baleada e aleijada pelo Coringa
na Piada Mortal e o manto foi passado para Cassandra Cain e depois para
Stephanie Brown. Inicialmente elas eram a resposta a pergunta: Como seriam
Batman e Superman de saias? Ou uma maneira de atrair o público feminino para as
histórias deles, buscando um novo filão de leitores, ou melhor, leitoras para
aumentar as vendas e o universo de super-heroínas para além das aventuras da
Mulher-Maravilha, porém é inegável o fato de que ganharam muito mais destaque e
saíram do segundo plano, tanto que Supergirl já ganhou uma fraca adaptação para
o cinema em 1984 com Helen Slater como a heroína e esse ano estréia uma nova
série de TV baseada nas aventuras da super prima do Homem de Aço embalada na
nova safra de produções inspiradas nos heróis da DC com as bem sucedidas Arrow
e Flash.
Mulher-Hulk:
Jennifer Walters é prima de Bruce
Banner, o Hulk, cresceu afastada do primo e se formou advogada. Enquanto estava
defendendo um criminoso, ela sofreu um atentado e foi baleada, para sua sorte e
destino nessa época Bruce estava passando por Los Angeles, enquanto conversava
com Jennifer sobre sua condição de fugitivo aconteceu o ataque. Para salvar sua
vida, Bruce fez uma transfusão do seu sangue irradiado e Jennifer passou a se
transformar na Mulher-Hulk. Um diferencial nessa situação é que Jennifer era
uma advogada respeitada e independente, a transformação só serviu para dar
maior vazão ao seu espírito lutador, tanto que prefere permanecer mais tempo na
forma de Mulher-Hulk do que como Jennifer Walters. Seu estilo de histórias
também foi mudado com a entrada de John Byrne no Quarteto, o autor famoso por
reestruturar personagens deu para suas aventuras um tom mais divertido e
fantasioso, tendência que foi esquecida com o tempo. Ex-integrante dos
Vingadores e do Quarteto, hoje está na A-Force com outras heroínas
pesos-pesados da Marvel.
Tempestade
e Jean Grey:
As mulheres mais famosas e poderosas
dos X-Men não poderiam ficar de fora. Ororo Munroe é descendente de uma
linhagem de sacerdotisas africanas, quando criança sua mãe morreu em um
desabamento causado por um bombardeio e ela ficou presa junto ao corpo da mãe
por dias, provocando sua famosa claustrofobia. Criada por um ladrão vagou pelo
país até seus dons mutantes começarem a aparecer, quando ela foi encontrada por
Charles Xavier estava usando seus dons como uma deusa tribal controladora do
clima, o Professor X buscava novos mutantes para organizar uma nova equipe de
X-Men e salvar o time original, sua estreia aconteceu em Giant Size X-Men #1 de
1975. Jean Grey é membro fundador dos X-Men, a última a entrar para o grupo
antes da primeira missão contra Magneto em X-Men #1 de 1963. Seus poderes se
ativaram acidentalmente quando viu sua amiga de infância ser atropelada,
assustados seus pais chamaram o Professor X que sentiu os grandes poderes
mutantes em Jean e, por segurança, criou bloqueios psíquicos que permaneceriam
até ela poder ser treinada no futuro de maneira apropriada, no entanto os
bloqueios foram insuficientes e Jean se tornou a Fênix Negra. Jean teve um
tímido começo nas HQs em X-Men, sua personagem fazia poucos e humildes truques
telecinéticos e sua presença era restrita a apoio ao grupo, situação bem
similar a Mulher Invisível do Quarteto na sua origem, somente com o tempo e o
excelente trabalho dos roteiristas que investiram em sua personalidade de Fênix
Negra é que a personagem assumiu um status de maior importância na saga dos
mutantes. Tempestade também foi beneficiada pelo trabalho diferenciado dos
roteiristas de X-Men que exploraram sua interação a uma cultura totalmente
diferente da sua, fazendo-a passar de uma selvagem orgulhosa a uma das maiores
integrantes da equipe, chegando a liderá-la por um tempo.
Muitas outras heroínas ficaram famosas
nas HQs e levaram um tempo para serem afastadas do estereótipo de objetos de
desejo e sensualidade passando para o respeitado time de defensoras da lei,
podemos citar exemplos como a Vespa, Poderosa, Víxen, Zatanna, Ravena, Estelar,
Medusa dos Inumanos, Viúva Negra, Jessica Jones, Capitã Marvel, Miss Marvel,
Vampira, Mulher-Gato e Mulher-Aranha. Os quadrinhos vinham timidamente deixando
de ser coisa de meninos há algum tempo, hoje temos mulheres desenhando e
roteirizando HQs. Esse universo está deixando de ser dominado pela testosterona
e está abrindo espaço para a presença bela e dominadora das mulheres, mas não
se engane com sua aparência bonita e jeito frágil, elas sabem como te mandar
para o hospital.
Por
Giulianno de Lima Liberalli
Colaborador
do Planeta Marvel/DC
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