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Colaboradores do Planeta: O que Um Herói Deve Simbolizar?

O que um herói deve simbolizar? Para responder a essa pergunta, nosso colaborador Giulianno de Lima Liberalli mergulha a fundo no âmago de quatro dos mais famosos heróis Marvel/DC, além de uma análise histórica que nos remete aos primórdios do heroísmo. O resultado você confere a seguir:


Desde as antigas lendas gregas sobre heróis como Hércules, Aquiles e Ulisses, a imagem do super-humano sempre foi usada para representar um ideal, seja de superação física, de vencer obstáculos cada vez maiores e difíceis para alcançar a glória do panteão ou o de simplesmente inspirar pessoas comuns a serem mais do que imaginam poder ser, a de se tornarem um ser cujas barreiras para a vitória existirão somente na sua imaginação e que tudo é possível de se realizar, basta estar revestido do espírito de luta para nunca retroceder. Mesmo com toda essa definição da imagem que um herói deveria transmitir, algumas vezes vemos que nem sempre é a visão de um ser perfeito que é retratada nas HQs, com o passar do tempo o perfil de um super-herói sofreu mudanças para adaptá-lo a realidade que vivemos e se distanciar do reino da fantasia e ficção. Claro que tudo que lemos nas HQs da Marvel e da DC é puramente fantasioso e fantástico, porém o herói foi perdendo a ‘persona’ de bom mocinho poderoso e ingênuo para chegar mais perto do homem comum, mas mantendo habilidades acima das pessoas normais.


Nos anos iniciais dos heróis das HQs nas primeiras décadas do século 20 a imagem do super-herói refletia o cavalheirismo das românticas aventuras de capa e espada, tudo se resumia a defender os inocentes, salvar o dia e a mocinha, ser o próprio reflexo da bondade. Os vilões representavam a escuridão, os mocinhos a luz pura da bondade, não existiam tons de cinza e nem se cogitava a mera ideia de que o herói poderia combater o mal sendo tão tenebroso quanto o seu oponente. Essa visão foi mudando com o tempo, retrato das mudanças comportamentais na sociedade, o herói com tendências à margem da lei de cumprir os seus objetivos foi ganhando mais e mais espaço e conquistando a simpatia dos leitores a largos passos.

Interessante que em suas primeiras histórias Batman era um vigilante que não hesitava em matar um inimigo se fosse necessário, carregava até uma arma para enfrentar os bandidos. Preocupados com as implicações negativas de se apresentar um herói que defendia a lei usando métodos não convencionais, os criadores se viram forçados a fazer algumas mudanças para atrair os leitores mais novos e afastar o Batman da aura pesada que foi concebida originalmente para o personagem, daí o bat-cinto de utilidades que é a coisa mais versátil já vista, possui mais apetrechos do que uma loja de departamentos, ali tem saída para qualquer situação ao ponto de ter um repelente de tubarões! E para afastá-lo mais ainda das trevas foi criado Robin, o parceiro mirim que deu origem a todos os parceiros mirins de super-heróis e Batman se tornou um herói cujas histórias pendiam mais para o mistério e as aventuras mirabolantes de tom mais juvenil, até um pouco bobo para os padrões atuais, situação que durou até Frank Miller imortalizar a versão definitiva do futuro do Homem-Morcego em Cavaleiro das Trevas. O herói que antes transmitia a imagem do aventureiro encapuzado na sua eterna cruzada pela justiça se tornou a personificação da justiça fria e implacável.

Nesse ponto Batman representa o ideal do homem comum quebrado pela tragédia que busca redenção para sua alma marcada nas trevas e na defesa das pessoas inocentes, cujas vidas ele não quer ver marcadas por uma sina parecida com a sua. E o que dizer do seu extremo? Aquele que representa a luz, a vida e a defesa de tudo que a humanidade possui de bom e que a guiará para um futuro brilhante? O Superman.

O Homem de Aço, o herói mais famoso do mundo, criado para ser o símbolo do modo americano de viver e ser a personificação do “american way of life”. O detalhe é que ele, sendo um alienígena, não pode ser considerado americano só por simplesmente ter caído nos Estados Unidos e lá ter sido criado como um deles. Ele poderia ter sido criado em qualquer país, o porém é como isso o afetaria, uma visão dessa possibilidade foi feita na excelente mini Superman: Entre a Foice e o Martelo, que mostra uma versão soviética do Homem de Aço e como o mundo seria afetado nessa situação. Apesar de alienígena, Superman adotou a humanidade como sua nova raça e passou a fazer de tudo para protegê-la, com o passar do tempo e com sua popularidade crescendo cada vez mais muitos elementos foram sendo acrescentados para aumentar o interesse nas suas aventuras, surgiram Supergirl, Krypto, o super cão, a Zona Fantasma, Kandor e a kryptonita com suas várias cores e efeitos diferentes no Homem de Aço e a imagem de bom moço era a constante das suas histórias, o sempre rebelde Arqueiro Verde até o chama de “Escoteiro Azulão” para zoar com o sempre certinho herói. Durante décadas essa personalidade permaneceu estável, seus poderes sempre aumentavam e se adequavam aos desafios que surgiam, nunca perdia um desafio até vir a Crise e o seu mundo ser transformado. Coube a John Byrne mostrar uma nova visão do Superman: não tão perfeito e em busca do seu lugar no mundo e a imagem do símbolo americano começou a mostrar dúvidas e inseguranças no seu dever para com o mundo trazendo mais o lado alien para fora, foi até mesmo forçado a matar outros kryptonianos que devastaram uma terra paralela assassinando bilhões de pessoas revelando que mesmo o mais correto dos heróis pode ser forçado a tomar medidas drásticas para proteger a humanidade.

Outra visão do modo americano é o Capitão América, desde sua criação ele já foi determinado como o modelo vivo dos Estados Unidos, seu próprio uniforme é a bandeira americana. Idealizado para inspirar o exército americano a combater a ameaça nazista com mais fervor durante a Segunda Grande Guerra, a capa de sua primeira revista era o herói socando diretamente a cara de Adolph Hitler em uma clara demonstração de que nada era capaz de barrar o avanço americano. Depois da Guerra o herói caiu no esquecimento até ser resgatado por Stan Lee e trazido para o mundo Marvel, para quem não sabe o Capitão não foi criado na Marvel, mas sim na Timely Comics em 1940, por Joe Simon e pelo mestre Jack Kirby, incorporado a Marvel em 1964 na clássica Avengers # 4. A imagem de bom moço e herói americano conservador continuaram nessa nova fase de sua existência e permaneceu por muito tempo, no entanto vários eventos começaram a mudar o modo de Steve Rogers defender o Sonho, seu contato com a corrupção e com os males causados por seus próprios compatriotas contra a nação o levaram a questionar aqueles que deveriam ser seus aliados: o governo e as forças armadas. Uma manobra armada pelo Caveira Vermelha fez com que Steve tivesse de entregar seu uniforme e escudo ao governo, ele adotou outra identidade e continuou a defender o povo americano, em outra situação chegou a ser considerado um possível candidato a presidência americana, mas chegou a conclusão de que seu lugar como defensor do povo era caminhando entre ele e não acima dele, apesar de toda a inspiração que sua imagem transmite. Recentemente Sam Wilson assumiu o manto do Capitão América e logo uma polêmica foi instaurada: declarou que o Capitão América era um defensor do povo americano e não um representante político dos interesses do governo.

Esses são exemplos de heróis que representam as trevas, a luz e o dever de luta pelo povo, várias das nossas próprias tendências de viver cegamente pela lei e ordem ou enxergando a verdade nas entrelinhas, no lado escuro do coração das pessoas, só que nem tudo precisa ser tão taxativo ou simbólico como essas imagens, talvez um dos que mais inspirem as pessoas a lutar mesmo quando tudo dá errado é o nosso amigão da vizinhança: o Homem-Aranha. Aquele que considero como o herói mais humano da Marvel é o mais popular dos super-heróis, alguém cuja vida passa por vários altos e baixos, muitos baixos na verdade e mesmo com tudo indo contra, sempre se levanta, sacode a poeira e dá a volta por cima de maneira triunfal, Stan Lee criou incorporou em Peter Parker a imagem da pessoa com problemas e dramas reais que assumiu uma grande responsabilidade e que deve cumprir com o seu dever não importando o custo para sua vida pessoal, várias vezes desistindo do seu fardo e recuperando a força de vontade para lutar sempre que percebia o quanto sua interferência era importante para o mundo e para as pessoas ao seu redor, não é tão diferente de nossa própria vida: temos que levantar todos os dias e arcar com nossas tarefas e obrigações, cada vez mais pesadas de acordo com a responsabilidade que assumimos. Com tudo de ruim que pode acontecer, a morte de entes queridos, a perda da própria identidade, poucos momentos de alegria e triunfo, no entanto com a certeza de que sua missão foi aceita de bom grado não importando os riscos, o Homem-Aranha é o símbolo de que um homem pode ser heróico tanto na vida normal quanto nas aventuras ao lado de tantos outros heróis e símbolos de honra e dever, assim está na mais famosa frase do mundo dos quadrinhos: “Com Grandes Poderes, Vem Grandes Responsabilidades”.

Com isso acredito que a imagem do herói deve simbolizar tanto no mundo Marvel como no mundo DC a vontade de encarar os desafios e os superar, mesmo quando as chances são contra, a maior derrota é o medo de tentar. Essa é a inspiração que os heróis nos passam: podemos vencer qualquer obstáculo, basta acreditar que temos o poder para tanto.


Por Giulianno de Lima Liberalli

Colaborador do Planeta Marvel/DC

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2 Comentários

  1. Conforme eu cometei antes Giulianno, para mim, é fundamental a motivação nas ações e atitudes de heróis e vilões. Focalizando nesses heróis que você citou, eu acho por exemplo, que a motivação original do Peter vem de uma consciência pesada pela morte do tio Ben, e é isso que faz com que ele sempre encontre forças extras para superar os obstáculos. Stan Lee foi mestre nisso, mas até aí, ele é o criador né. Porém, percebi muito disso na fase do Straczynski que é uma das que eu mais gosto. No caso da Batman, fica evidente de onde vem sua obsessão no combate ao crime e todos os escritores até hoje nunca negaram sua origem, que vem do assassinato de seus pais. John Byrne soube muito bem trabalhar a motivação do Super e o que ele deveria simbolizar para o mundo. Me parece que a fase do Straczynski mais "pé no chão" também tratou desse assunto, mas não cheguei a ler ainda. Entre a Foice e o Martelo eu não li pois espero por uma republicação da Panini que deve vir, se eu não me engano. Quanto ao Cap., sua posição firme em defender seus ideais nunca se misturaram com um patriotismo disfarçado, e isso sempre em atraiu nesse herói, assim como você já mencionou em algumas de suas histórias clássicas dos anos 70 e 80. A fase do Brubaker, um pouco mais calcada no realismo e espionagem também não se esqueceu desse lado idealista de Steve Rogers durante a Guerra Civil. Gostei muito do artigo por resgatar conceitos que todo herói deveria ter, independente de qual época ele viva.

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    1. Roger, foi bom ver que consegui transmitir a mensagem. Concordo com sua análise sobre o que levantei, no entanto no caso de Peter, além do sentimento de culpa também sinto a pressão pelo fato de ele ser o Homem-Aranha justamente para honrar a frase do Tio Ben: 'Com grandes poderes...' e lutar para que ninguém passe por uma perda como a dele. É uma causa enorme, praticamente como carregar todo o peso do mundo nas costas sem que ninguém dê os parabéns para ele, mas sabe que suas ações fazem a diferença. Ele seria o herói que é se tivesse impedido o assaltante? Vai saber. Brubaker trouxe um tom mais adulto e 007 para o Capitão, ficou muito bom, até hoje lembro de uma história em que o Capitão teve que metralhar um terrorista para que ele não matasse ninguém e me marcou muito pela reação dele diante do fato que, às vezes, para preservar a liberdade medidas extremas são necessárias. Heróis devem inspirar justiça e respeito sempre.

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