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Colaboradores do Planeta: Leitura Recomendada - Homem-Animal de Grant Morrison

Retornando de suas investigações nos pântanos do Bayou sobre o Monstro do Pântano de Alan Moore, nosso colaborador Giulianno de Lima Liberalli investe a fundo na fauna do universo DC e traz à tona a complexidade desse subestimado herói, o Homem-Animal às mãos de Grant Morrison.


Quem acompanha regularmente os lançamentos da Panini sabe que a editora tem seus altos e baixos, mas não é culpa dela, são as obrigações contratuais. Entretanto como recentemente quadrinhos de qualidade tem chegado as bancas e as livrarias especializadas para alegria dos leitores mais exigentes um material excelente foi lançado pelo selo VERTIGO e está no seu segundo volume: Homem-Animal de Grant Morrison, clássico dos anos 90 e um grande acerto da Panini.

Grant Morrison é um escritor escocês que possui um currículo impressionante no mundo das HQs, seus trabalhos são marcantes e com temática altamente profunda como OS INVISÍVEIS, GRANDES ASTROS: SUPERMAN, BATMAN DESCANSE EM PAZ e ASILO ARKHAM, entre outros. Homem-Animal sempre foi um personagem do segundo escalão da DC, seus poderes de assimilar temporariamente as características de animais próximos dão margem a grandes possibilidades criativas nas mãos certas e é isso que essa sequência de volumes prova: Morrison pegou um conceito frágil e limitado e colocou em outro nível de qualidade, por isso é um material muito recomendado para quem procura uma leitura agradável e altamente inteligente. Para se ter uma ideia vamos pegar o exemplo do Homem-Aranha, cuja força é proporcional a de uma aranha multiplicada para um corpo humano, se a aranha possui força para levantar ou carregar materiais muito superiores ao seu tamanho e peso, com
o as formigas, transferidas para um corpo humano faz do herói capaz de erguer carros e possuir força sobre-humana, então se o Homem-Animal assimila a força de um inseto tem sua própria força multiplicada várias vezes, chegando a erguer toneladas sem dificuldade e não é só a força, como cada animal tem capacidades especiais as possibilidades beiram o infinito.

Buddy Baker é um dublê de cinema com a carreira decadente que se vê tentado a usar seus poderes animais como uma forma de ajudar a esposa e sustentar a família, em pouco tempo já se percebe que o autor tem muito mais a mostrar do que uma mera reformulação como as tantas que aconteceram no universo DC pós-crise, tanto que essa passagem pelo título lhe abriu as portas definitivamente para o sucesso nos Estados Unidos. No primeiro volume, O EVANGELHO DO COIOTE, Morrison resgata o personagem nas primeiras quatro histórias envolvendo um mistério sobre um super-humano que ataca um laboratório de pesquisas usando estranhas formas mutantes a partir de animais e insetos, Buddy é chamado para investigar, não demora muito para ele perceber que os papéis estão invertidos e o pior vilão é o próprio homem. A versatilidade dos seus poderes é mostrada nessas histórias iniciais de maneira clara e crua porque apesar de ser super-humano, Baker só tem habilidades especiais quando as copia de um animal, fora isso é um homem comum, em um momento de distração ele pode morrer confrontando um inimigo.


A barreira é rompida de vez e Morrison mostra a que veio já na quinta história, a Cult O EVANGELHO DO COIOTE que dá nome ao primeiro volume onde Buddy encontra uma misteriosa versão do coiote do papa-léguas no nosso mundo real, ou no mundo das HQs, dando a entender que uma mente superior existe para puxar as cordinhas da realidade ou determinar os destinos daqueles abaixo dela, o mais marcante é que não existe uma interpretação exata para essa história em particular que destrói os limites da quarta parede, ela praticamente possui um sentido para cada pessoa que a lê, fascinante é a uma das melhores definições para ela e depois disso é ladeira abaixo e a criatividade do autor leva o herói a situações cada vez mais instigantes. Buddy começa a adotar uma postura de proteção aos animais, forçando até a família a se tornar vegetariana, lutando contra aqueles que ferem os direitos dos animais, mas precisa encontrar seu lugar como pai e chefe de família mostrando que até os heróis precisam cuidar dos seus antes de saírem pelo mundo defendendo causas ou espécies.

Intercalando com uma significativa participação na saga INVASÃO, cujos poderes ficaram bagunçados devido a bomba genética alienígena que afetou vários heróis, e o ingresso na Liga da Justiça em uma história com uma ótima participação do Caçador de Marte, as histórias vão ganhando tons e nuances mais definidas chegando ao segundo volume, ORIGEM DAS ESPÉCIES, onde logo de cara vemos a origem clássica do Homem-Animal para descobrir que nada daquilo foi verdade e que tudo foi orquestrado por uma inteligência altamente superior e o Homem-Animal descobre que sua vida foi moldada e definida de maneira a impedir que a própria realidade entrasse em colapso, surreal no mínimo. A normalização dos seus poderes mostra que apenas a sua imaginação e os seus receios podem limitar suas capacidades.

As consequências de sua postura em defesa dos animais começam a dar sinais de problemas para sua vida quando ele começa a perceber que interesses pessoais e corporativos podem se colocar acima das necessidades daqueles que ele defende e que nem tudo pode ser preto no branco como pensava, só que os resultados dessas ações só veremos no terceiro volume a ser lançado, DEUS EX MACHINA, trazendo as últimas edições de Morrison no título e a sua despedida do personagem, reflexo disso é que Homem-Animal caiu no esquecimento até os Novos 52 quando foi trazido de volta a cena. Fato curioso é que as edições da VERTIGO vem com aviso de leitura desaconselhável para menores de 18 anos e a época de suas publicações no Brasil foram na extinta revista DC 2000 pela Abril, publicação normal em formatinho dividindo espaço com Starman, Xeque-Mate e Legião dos Super-Heróis, porque temas complexos que Morrison aborda como racismo, política e defesa dos animais ficaram subestimados entre histórias mais simples de super-heróis, só que esses encadernados trazendo tudo em sequência dão um entendimento muito melhor da proposta do autor, bem mais relevantes no momento da história em que vivemos hoje, o que ainda acho uma falha da Panini é a falta de um bom texto introdutório sobre o personagem para situar melhor os leitores mais novos. Vale muito a pena dar uma conferida nesse material excelente e ler e reler várias vezes.

Por Giulianno de Lima Liberalli
Colaborador do Planeta Marvel/DC


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5 Comentários

  1. Já li vários comentários e análises sobre o Evangelho do Coiote, mas nenhum deles mencionou algo que eu também acho - abre um leque de interpretações que faz com que seja uma experiência fantástica e aberta a bons debates. O tie-in da saga Invasão é um dos melhores que já li até hoje. Morrison conseguiu utilizar a passagem do Homem-Animal nessa saga de maneira inteligente e que prende o leitor. E olha que normalmente tie-ins são quase que dispensáveis (não todos, mas na maioria das vezes). Estou esperando chegar o segundo volume para ter uma visão melhor complementando sua análise. Também concordo com a bizarra inclusão do Homem-Animal no mix de DC 2000. É claro que eu gostava de ler o mix, mas se for pensar bem, esse título contrastava com os demais. A Abril fez algo parecido com a inclusão do Motoqueiro Fantasma no mix de Heróis da TV, na minha opinião. Tanto é que a Panini lançou um encadernado do Motoqueiro com o selo Marvel Terror, assim como fez com Drácula.

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    1. Oi, Roger. É realmente estranho que o Evangelho tenha mais de um significado e que seja correto em bem mais de um deles, a primeira vez que li fiquei fascinado e na segunda, entendi melhor e hoje acho fantástica. No segundo volume você vai melhor essa expansão genial do Morrison e ele faz um questionamento que vi no final do Monstro do Pântano de Alan Moore: Mesmo com todo o poder que um herói possui, ele tem o direito de interferir nas decisões humanas e poderá arcar com as consequências? Gostei por ter citado o Motoqueiro Fantasma, quem leu esse especial Marvel Terror lançado recentemente, como eu, deve ter ficado surpreso com quanta referência satanista na HQ, no passado os editores tinham mais vista grossa com certos detalhes em HQs voltadas para o público infanto-juvenil.

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    2. Esse é um daqueles poucos quadrinhos, que fala-se tanto, que parece que eu já conheço a história antes de ler. Ao menos a participação do "Coiote" no enredo, e o Homem-Animal se encontrar no fim o Grant Morrison.

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    3. Pois é, Ozymandias, esse é o efeito provocado por um trabalho inovador: acaba virando referência e marcando época.

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